quarta-feira, 21 de setembro de 2011

O maior e melhor superlativo da publicidade

Se há uma coisa que me incomoda na nossa profissão de escrevinhador publicitário é o apreço cego e descabido pelo superlativo. Mesmo quando sabemos perfeitamente que não há motivo algum para tanta bajulação, lá estamos nós desmoralizando a nossa imagem, escrevendo, reescrevendo, trescrevendo bobagens as mais absurdas sobre o que quer que seja. Já foi sobre o Collor (mas aí a coisa se explicava), já foi sobre um sem-número de outras coisas. A mais recente foi sobre o tal carro de 3 portas... Santa bobagem, Batman! Curiosamente, o mestre Ruy Castro, na Folha de hoje, veio em meu socorro mostrar que não estou sozinho. Na sua coluninha, sob o nada publicitário título de Três portas, eis aí o que ele diz. Leia e diga se não andamos precisando de um pouco menos de grandiloquência vazia:

Antes que você comece a ler, devo adverti-lo: sou ignorante a respeito de carros. Nunca dirigi, não distingo um fusca de uma jamanta, e o único equipamento de bordo que, como copiloto, já manobrei foi o isqueiro do carro.
Páginas e páginas na mídia estão anunciando que "finalmente chegou o lançamento mais espetacular de todos os tempos": o carro de três portas. Embatuquei: por que "finalmente"? Não sabia que a humanidade estava paralisada, sôfrega e expectante por essa novidade que vem alterar a ordem do universo. E o que impedia que tal maravilha fosse inventada antes? Também não sei. Mas, e daí? O fato é que finalmente temos o carro de três portas.
Virando a página do anúncio, leio que o carro de três portas é "simplesmente genial". Exceto pelo apreço do redator por advérbios de modo, o texto informa pouco a respeito das vantagens de um carro ter três portas, e não duas ou quatro como de praxe desde 1900. Tirando os óculos para ler melhor, descubro em letras miúdas: "Total segurança para desembarque de passageiros somente pelo lado direito".
Ah, bom. Significa que, a partir de hoje, ninguém será abalroado por outro veículo ao sair de forma atabalhoada de um carro pelo lado esquerdo -porque não existe mais a porta traseira esquerda. Mas, pelo visto, o motorista continuará correndo esse risco. Por que não eliminar também a sua porta, mantendo apenas as duas do lado direito?
Para o Rio, o carro de três portas chega em má hora. Com as pistas da direita reservadas agora somente aos ônibus e táxis em Copacabana, em Ipanema e no Leblon, os particulares são obrigados a trafegar, embarcar e desembarcar pela esquerda. Donde o carro de três portas nasceu impraticável em três dos bairros mais abonados do Brasil.

Nenhum comentário: