Mais um texto do Contardo Calligaris, de hoje, na Folha. É uma espécie de continuação daquele da semana passada, onde ele trata das questões da culpa e do prazer. O título deste é Fazer uma doença. Vejam se não bate muito com o nosso jeito de ser.
Vários leitores pediram que eu insistisse no mesmo tema da semana passada: por que a culpa é um de nossos jeitos preferidos para dar sentido ao mundo? Como é possível que, diante de uma desgraça, o fato de sentirmo-nos culpados constitua, para nós, uma espécie de conforto?
Todos conhecemos as expressões usuais pelas quais, por exemplo, Fulano ou Fulana podem eles mesmos admitir que "fizeram um câncer" -e não foi porque fumaram dois maços de cigarros por dia durante a vida inteira, nem porque, verão após verão, deitaram no sol para bronzear a pele, sem protetor algum. Nada disso: a expressão "fazer uma doença", em geral, indica outro tipo de responsabilidade. Mas vamos devagar.
Não é raro que a primeira reação de quem recebe um diagnóstico maligno consista em procurar uma intenção escusa da qual ele poderia ser a vítima. Envenenaram a água da cidade; o ar é repleto de resíduos daquela fábrica cuja chaminé solta fumaça a cada noite; há um dentista que tem consultório acima do meu, ninguém sabe quantos raios-x ele faz por dia, será que ele isolou sua sala do jeito certo ou será que a radiação chega até aqui?
Na mesma linha, Deus ou o diabo podem ser os mandantes de minha desgraça. Deus, porque ele quer colocar à prova minha fé, como ele já fez com Jó. O diabo, porque ele é príncipe aqui na terra e todo o mal vem dele.
Essas reações parecem ter o mesmo propósito dos delírios paranoicos: elas acusam um agente externo (Deus, o diabo ou os vizinhos) para que o mundo ganhe sentido, ou seja, no caso, para que o mal que se abate sobre a gente tenha uma explicação. "Adoeci porque alguém me quis mal": graças a essa crença, não sofro por acidente nem por acaso, mas sou vítima de uma vontade que me castiga ou me testa. O que se ganha com isso? Antes de responder, mais uma observação.
Em geral, quando temos intenções que preferimos esconder de nós mesmos, uma boa solução é atribui-las a outros. Portanto, não seria de todo estranho que a gente acusasse Deus e todo mundo por males que nós mesmos causamos.
Desse ponto de vista, reconhecer que nós somos os primeiros culpados de nossa desventura seria um progresso. Algo assim: até que, enfim, o cara se tocou, não foi Deus, não foi o demônio, nem a usina química no morro atrás da casa, foi ele mesmo que "fabricou" sua doença.
Geralmente, a explicação deste "fabricar sua doença" passa quer seja por uma poética do estouro (emoções contidas e silenciadas tiveram que se expressar e explodiram numa neoplasia), quer seja por uma poética da erosão (as mesmas emoções reprimidas foram atacando o corpo como a famosa gota que cava a pedra, não pela força, mas caindo repetidamente).
Tanto faz: o que me importa dizer é que entre acusar a Deus e todo mundo e acusar a nós mesmos não há progresso algum.
A posição de vítima (Deus, o diabo e os vizinhos me querem mal) e a posição de culpado (eu fabriquei minha doença porque meu inconsciente é meu verdadeiro inimigo), ambas são chamadas a "explicar" o mal que nos assola, porque, aparentemente, preferimos sofrer de um mal explicado a sofrer de um mal aleatório. Por que isso? Simples: tanto se eu for a vítima escolhida por Deus e pelo mundo quanto se eu for a vítima de mim mesmo, apesar de doente, eu me manterei nas luzes da ribalta.
Em suma, agimos e pensamos como se nosso sofrimento pudesse ser aliviado por uma compensação narcisista: a desventura é terrível, mas, ao menos, como vítima ou como culpado, sairei na foto. Não é uma consolação?
Talvez. Mas é uma consolação custosa, porque, nessa foto em que sou vítima ou culpado, a desventura é o que me define, o que me resume.
De fato, qualquer sofrimento seria um fardo mais leve se ele pudesse aparecer como quase sempre é: um mal sem sentido, que não faz parte de nenhum plano e não é fruto de nenhuma vontade escusa, nem da nossa.
Teste de boa saúde: estamos bem quando podemos ser atropelados sem ter que considerar que alguém tentou nos matar ou que nós mesmos nos jogamos nas rodas do caminhão, empurrados por impulsos inconfessáveis.
Um amigo querido morreu de um câncer que ele não fabricou e que não lhe foi imposto nem por Deus nem pelo diabo nem pelos vizinhos. Ele dizia: os males reais são suficientemente graves para que a gente não se esforce para lhes acrescentar mil sentidos imaginários.
quinta-feira, 31 de março de 2011
Brasil, mostre o seu valor, pôxa!
Está na hora dessa gente brasileira mostrar seu valor, já dizia um samba velhinho, bem velhinho do Assis Valente: Brasil Pandeiro, pra ser mais preciso. É desdenhar demais deste tal valor quando a gente abre jornais, revistas, televisões e o que mais a nosso alcance e nos deparamos com a mais nova polêmica para nos ativar o senso crítico: Preta Gil versus Bolsonaro. Repetindo: Preta Gil versus Bolsonaro. O coitado do Assis Valente deve estar rodopiando nas catacumbas, mais do que as mulatas rocamboleando com seu samba.
Desacontecimentos da semana
Devo ser eu o problema. Não aguento mais abrir o portal globo.com e dar de cara com textos lascivos, muito parecidos com aqueles que a gente lia escondido na escola nas chamadas revistinhas de sacanagem. Todo dia fico sabendo que alguém beijou alguém, que não sei quem se masturbou, que outro quem foi pra baixo do cobertor com outro quem, que subiram juntos para o mesmo quarto...
É pouco? Pois não aguento mais outra coisa: a Hebe, espécie de José Alencar de saias, a dar beijinhos em tudo e em todos que lhe passam pelo caminho. E a mídia lá, se deliciando com esses desacontecimentos.
É pouco? Pois não aguento mais outra coisa: a Hebe, espécie de José Alencar de saias, a dar beijinhos em tudo e em todos que lhe passam pelo caminho. E a mídia lá, se deliciando com esses desacontecimentos.
quarta-feira, 30 de março de 2011
Amigos sem defeito; inimigos, se não têm, invente
Agora pensem ao contrário: se para uns é reservado o fogo do inferno, como no caso anterior, referente ao artigo do Caetano, para outros, não há a menor possibilidade de haver ao menos um palito de fósforo aceso. Não que signifique desmerecimento para a personalidade em si, mas é de dar nos nervos acompanhar o tratamento que é dado pela mídia ao ex-vice José Alencar, finalmente falecido ontem, depois de uma verdadeira epopéia em sua luta pela vida. É isso. O que é insuportável é a quase condição de mártir que é dada, com todas as tintas de uma pessoa imaculada, sobre a qual não há o registro de um mínimo defeito, um deslize, um ato falho. Não, o ex-vice do Lula merece um estado de comoção que deve ultrapassar as grandes tragédias universais, quem sabe não justificaria um esforço pela sua canonização... Insuportável: para a mídia, não basta o limite do drama familiar, a morte de um símbolo de luta como o ex-vice tem de ser transformada num espetáculo interminável, mas que vai terminar assim que as luzes e as câmeras se apagarem.
De puritanismos, denuncismos e udenismos
Não estou muito com o Caetano nas suas polêmicas milimetricamente calculadas para não escapar da mídia por muito tempo. Estou muito com ele em relação aos trabalhos que realiza, às canções que compõe e canta, ao seu jeito vanguardista muito mais moderno que muitos bobocas de 20, 30 ou 40 anos por aí. Como estou com ele nesta crítica chiliquenta que faz aos jornalistas de uma maneira geral, especificamente a Veja e a Folha, que se esmeraram em carregar nas tintas em relação a alguns "inimigos", não havendo nada que lhes sirva de trégua. Foram os casos recentes do Chico Buarque e agora da Maria Bethânia, que foram e são enxovalhados diariamente, quase que sem direito a defesa. Os gigantões detonam o processo e atrás deles surgem os leitores e internautas, inocentes úteis a dar suas opiniões, criar seus vídeos, destilar sua bílis e, principalmente, corroborar a linha assumida pela mídia. Bem faz o Caetano quando vem, histericamente, e detona essa bobagem toda, denunciando este misto de puritanismo, denuncismo e udenismo que já desgraçaram o país dezenas e dezenas de vezes. O texto foi publicado no Globo, dia 20, sob o título O linchamento de Bethânia:
Não concebo por que o cara que aparece no YouTube ameaçando explodir o Ministério da Cultura com dinamite não é punido. O que há afinal? Será que consideram a corja que se "expressa" na internet uma tribo indígena? Inimputável? E cadê a Abin, a PF, o MP? O MinC não é protegido contra ameaças?
Podem dizer que espero punição porque o idiota xinga minha irmã. Pode ser. Mas o que me move é da natureza do que me fez reagir à ridícula campanha contra Chico [Buarque] ter ganho o prêmio de Livro do Ano. Aliás, a Veja (não, Reinaldo, não danço com você nem morta!) aderiu ao linchamento de Bethânia com a mesma gana. E olha que o André Petry, quando tentou me convencer a dar uma entrevista às páginas amarelas da revista marrom, me assegurou que os então novos diretores da publicação tinham decidido que esta não faria mais "jornalismo com o fígado" (era essa a autoimagem de seus colegas lá dentro). Exigi responder por escrito e com direito a rever o texto final. Petry aceitou (e me disse que seus novos chefes tinham aceito). Terminei não dando entrevista nenhuma, pois a revista (achando um modo de me dizer um "não" que Petry não me dissera – e mostrando que queria continuar a "fazer jornalismo com o fígado") logo publicou ofensa contra Zé Miguel [Wisnik], usando palavras minhas.
Política do corinho A histeria contra Chico me levou a ler o romance de Edney Silvestre (que teria sido injustiçado pela premiação de Leite derramado). Silvestre é simpático, mas, sinceramente, o livro não tem condições sequer de se comparar a qualquer dos romances de Chico: vi o quão suspeita era a gritaria, até nesse pormenor. Igualmente suspeito é o modo como Folha, Veja e uma horda de internautas fingem ver o caso do blog de Bethânia. O que me vem à mente, em ambas as situações, é a desaforada frase obra-prima de Nietzsche: "É preciso defender os fortes contra os fracos." Bethânia e Chico não foram alvejados por sua inépcia, mas por sua capacidade criativa.
A Folha disparou, maliciosamente, o caso. E o tratou com mais malícia do que se esperaria de um jornal que – embora seu dono e editor tenha dito à revista Imprensa, faz décadas, que seu modelo era a Veja – se vende como isento e aberto ao debate em nome do esclarecimento geral.
A Veja logo pôs que Bethânia tinha ganho R$ 1,3 milhão quando sabe-se que a equipe que a aconselhou a estender à internet o trabalho que vem fazendo apenas conseguiu aprovação do MinC para tentar captar, tendo esse valor como teto. Os editores da revista e do jornal sabem que estão enganando os leitores. E estimulando os internautas a darem vazão à mescla de rancor, ignorância e vontade de aparecer que domina grande parte dos que vivem grudados à rede. Rede, aliás, que Bethânia mal conhece, não tendo o hábito de navegar na web, nem sequer sentindo-se atraída por ela.
Os planos de Bethânia incluíam chegar a escolas públicas e dizer poemas em favelas e periferias das cidades brasileiras. Aceitou o convite feito por Hermano [Vianna] como uma ampliação desse trabalho. De repente vemos o Ricardo Noblat correr em auxílio de Mônica Bergamo, sua íntima parceira extracurricular de longa data. Também tenho fígado. Certos jornalistas precisam sentir na pele os danos que causam com suas leviandades. Toda a grita veio com o corinho que repete o epíteto "máfia do dendê", expressão cunhada por um tal [Claudio Julio] Tognolli, que escreveu o livro de Lobão, pois este é incapaz de redigir (não é todo cantor de rádio que escreve um Verdade tropical). Pensam o quê? Que eu vou ser discreto e sóbrio? Não. Comigo não, violão.
Vício arraigado O projeto que envolve o nome de Bethânia (que consistiria numa série de 365 filmes curtos com ela declamando muito do que há de bom na poesia de língua portuguesa, dirigidos por Andrucha Waddington), recebeu permissão para captar menos do que os futuros projetos de Marisa Monte, Zizi Possi, Erasmo Carlos ou Maria Rita. Isso para só falar de nomes conhecidos. Há muitos que desconheço e que podem captar altíssimo. O filho do Noblat, da banda Trampa, conseguiu R$ 954 mil. No audiovisual há muitos outros que foram liberados para captar mais. Aqui o link.
Por que escolher Bethânia para bode expiatório? Por que, dentre todos os nossos colegas (autorizados ou não a captar o que quer que seja), ninguém levanta a voz para defendê-la veementemente? Não há coragem? Não há capacidade de indignação? Será que no Brasil só há arremedo de indignação udenista? Maria Bethânia tem sido honrada em sua vida pública. Não há nada que justifique a apressada acusação de interesses escusos lançada contra ela. Só o misto de ressentimento, demagogia e racismo contra baianos (medo da Bahia?) explica a afoiteza.
Houve o artigo claro de Hermano Vianna aqui neste espaço. Houve a reportagem equilibrada de Mauro Ventura. Todos sabem que Bethânia não levou R$ 1,3 milhão. Todos sabem que ela tampouco tem a função de propor reformas à Lei Rouanet. A discussão necessária sobre esse assunto deve seguir. Para isso, é preciso começar por não querer destruir, como o Brasil ainda está viciado em fazer, os criadores que mais contribuem para o seu crescimento. Se pensavam que eu ia calar sobre isso, se enganaram redondamente. Nunca pedi nada a ninguém. Como disse Dona Ivone Lara (em canção feita para Bethânia e seus irmãos baianos): "Foram me chamar, eu estou aqui, o que é que há?"
Não concebo por que o cara que aparece no YouTube ameaçando explodir o Ministério da Cultura com dinamite não é punido. O que há afinal? Será que consideram a corja que se "expressa" na internet uma tribo indígena? Inimputável? E cadê a Abin, a PF, o MP? O MinC não é protegido contra ameaças?
Podem dizer que espero punição porque o idiota xinga minha irmã. Pode ser. Mas o que me move é da natureza do que me fez reagir à ridícula campanha contra Chico [Buarque] ter ganho o prêmio de Livro do Ano. Aliás, a Veja (não, Reinaldo, não danço com você nem morta!) aderiu ao linchamento de Bethânia com a mesma gana. E olha que o André Petry, quando tentou me convencer a dar uma entrevista às páginas amarelas da revista marrom, me assegurou que os então novos diretores da publicação tinham decidido que esta não faria mais "jornalismo com o fígado" (era essa a autoimagem de seus colegas lá dentro). Exigi responder por escrito e com direito a rever o texto final. Petry aceitou (e me disse que seus novos chefes tinham aceito). Terminei não dando entrevista nenhuma, pois a revista (achando um modo de me dizer um "não" que Petry não me dissera – e mostrando que queria continuar a "fazer jornalismo com o fígado") logo publicou ofensa contra Zé Miguel [Wisnik], usando palavras minhas.
Política do corinho A histeria contra Chico me levou a ler o romance de Edney Silvestre (que teria sido injustiçado pela premiação de Leite derramado). Silvestre é simpático, mas, sinceramente, o livro não tem condições sequer de se comparar a qualquer dos romances de Chico: vi o quão suspeita era a gritaria, até nesse pormenor. Igualmente suspeito é o modo como Folha, Veja e uma horda de internautas fingem ver o caso do blog de Bethânia. O que me vem à mente, em ambas as situações, é a desaforada frase obra-prima de Nietzsche: "É preciso defender os fortes contra os fracos." Bethânia e Chico não foram alvejados por sua inépcia, mas por sua capacidade criativa.
A Folha disparou, maliciosamente, o caso. E o tratou com mais malícia do que se esperaria de um jornal que – embora seu dono e editor tenha dito à revista Imprensa, faz décadas, que seu modelo era a Veja – se vende como isento e aberto ao debate em nome do esclarecimento geral.
A Veja logo pôs que Bethânia tinha ganho R$ 1,3 milhão quando sabe-se que a equipe que a aconselhou a estender à internet o trabalho que vem fazendo apenas conseguiu aprovação do MinC para tentar captar, tendo esse valor como teto. Os editores da revista e do jornal sabem que estão enganando os leitores. E estimulando os internautas a darem vazão à mescla de rancor, ignorância e vontade de aparecer que domina grande parte dos que vivem grudados à rede. Rede, aliás, que Bethânia mal conhece, não tendo o hábito de navegar na web, nem sequer sentindo-se atraída por ela.
Os planos de Bethânia incluíam chegar a escolas públicas e dizer poemas em favelas e periferias das cidades brasileiras. Aceitou o convite feito por Hermano [Vianna] como uma ampliação desse trabalho. De repente vemos o Ricardo Noblat correr em auxílio de Mônica Bergamo, sua íntima parceira extracurricular de longa data. Também tenho fígado. Certos jornalistas precisam sentir na pele os danos que causam com suas leviandades. Toda a grita veio com o corinho que repete o epíteto "máfia do dendê", expressão cunhada por um tal [Claudio Julio] Tognolli, que escreveu o livro de Lobão, pois este é incapaz de redigir (não é todo cantor de rádio que escreve um Verdade tropical). Pensam o quê? Que eu vou ser discreto e sóbrio? Não. Comigo não, violão.
Vício arraigado O projeto que envolve o nome de Bethânia (que consistiria numa série de 365 filmes curtos com ela declamando muito do que há de bom na poesia de língua portuguesa, dirigidos por Andrucha Waddington), recebeu permissão para captar menos do que os futuros projetos de Marisa Monte, Zizi Possi, Erasmo Carlos ou Maria Rita. Isso para só falar de nomes conhecidos. Há muitos que desconheço e que podem captar altíssimo. O filho do Noblat, da banda Trampa, conseguiu R$ 954 mil. No audiovisual há muitos outros que foram liberados para captar mais. Aqui o link.
Por que escolher Bethânia para bode expiatório? Por que, dentre todos os nossos colegas (autorizados ou não a captar o que quer que seja), ninguém levanta a voz para defendê-la veementemente? Não há coragem? Não há capacidade de indignação? Será que no Brasil só há arremedo de indignação udenista? Maria Bethânia tem sido honrada em sua vida pública. Não há nada que justifique a apressada acusação de interesses escusos lançada contra ela. Só o misto de ressentimento, demagogia e racismo contra baianos (medo da Bahia?) explica a afoiteza.
Houve o artigo claro de Hermano Vianna aqui neste espaço. Houve a reportagem equilibrada de Mauro Ventura. Todos sabem que Bethânia não levou R$ 1,3 milhão. Todos sabem que ela tampouco tem a função de propor reformas à Lei Rouanet. A discussão necessária sobre esse assunto deve seguir. Para isso, é preciso começar por não querer destruir, como o Brasil ainda está viciado em fazer, os criadores que mais contribuem para o seu crescimento. Se pensavam que eu ia calar sobre isso, se enganaram redondamente. Nunca pedi nada a ninguém. Como disse Dona Ivone Lara (em canção feita para Bethânia e seus irmãos baianos): "Foram me chamar, eu estou aqui, o que é que há?"
terça-feira, 29 de março de 2011
"Dá cá o meu", versão para mestrado
Este texto vem a propósito de um artigo publicado pela jornalista Nádia Timm onde houve espaço à disposição para, a título de investigar a clareza dos critérios da Facomb em suas seleções de mestrado (bem como de todos os seus outros concursos, estes não citados por ela), desancar com a faculdade, a universidade, os mestres em comunicação que cometeram a vileza de serem aprovados e por aí afora. Seguramente não é o caso, mas que fica parecendo choro de quem não foi aprovado, lá isso fica.
Como um dos primeiros mestres em comunicação pela Facomb, professor da PUC e Uni-Anhanguera, publicitário com alguns prêmios importantes na cacunda, devo dizer o quanto me pareceu salutar a discussão levantada pela jornalista Timm.
Como um dos primeiros mestres em comunicação pela Facomb, professor da PUC e Uni-Anhanguera, publicitário com alguns prêmios importantes na cacunda, devo dizer o quanto me pareceu salutar a discussão levantada pela jornalista Timm.
Salutar como é - e deve ser - toda discussão que vise o passo à frente.
Já diziam os nossos avós que, neste pormenor, até o tropeção é salutar, pois quase nunca se tropeça pra trás. Desafortunadamente, o que chama a atenção no texto que originou tudo isso é que transparece mais uma querela pessoal da jornalista do que propriamente uma discussão sobre os rumos da pós-graduação na Facomb, em Goiás, no Brasil e no mundo.
Será que a jornalista está mesmo interessada nesta visão mais amplificada? Se sim, houve algum erro na sua comunicação. Os nossos mesmos avós já diziam que é sempre melhor sermos reconhecidos pelos nossos méritos do que desqualificando os méritos dos outros.
Vá lá que esta não é uma prática muito usual nesta nossa sociedade líquida e bocuda, onde tudo é sutilmente encaminhado para uma espécie de debate esportivo ou político, onde cada um diz as verdades mais duras com a certeza de que logo depois, malgrado até mesmo não serem verdade coisa nenhuma, elas estarão devidamente esquecidas. Como diz um amigo também mineiro, vivemos um tempo em que reputações estão aí para serem destruídas.
Não me chamo Poliana, entendo que tanto quanto as discussões, a transparência será sempre salutar e bem-vinda, mas não será chegada a hora de nós todos compartilharmos um pouco mais de ponderação e caldo de galinha? Não dá pra começar a corrigir os males do mundo com um "dá cá o meu" desses.
Julices e Gabrielices
Com tia mana por perto, fim de semana de praia sem sair do refúgio, volta pra casa, piriris sem conta, e duas frasezinhas dos personagens aí de cima, dirigidas ao pai: "relaxa!", no duro confronto com as boias da correnteza; e "isso é jeito de falar com filho?", quando ao perguntar a um deles se já queria fazer tarefa. Ai, ai, ai, meu pai, vê se aprende.
sexta-feira, 25 de março de 2011
Vamos fazer melhor: Amoroso inteiro
Esqueçam só Estate. Ouçam o disco Amoroso, completo, do João Gilberto. Está comprovado cientificamente que que não o ouvir ao menos dez vezes não alcançará jamais o reino dos céus.
Sessão de hipnose gratuita
Procurem a versão inteira da música Estate, cantada por João Gilberto. São 6:28 de puro êxtase. Caso não gostem, continuem se emocionando com os poemas do Pedro Bial naquele programa de telessexo da televisão.
quinta-feira, 24 de março de 2011
Foram feitos por mim
http://www.youtube.com/watch?v=YsFGY63xnko
Visitem este link e vejam alguns filmes deste escrevinhador de linhas tortas. O xodó da vovó é o primeiro comercial, do fósforo queimando, que seguramente foi uma das peças mais premiadas da propaganda de Goiás: festival de Gramado, prêmio Colunistas, prêmio Jaime Câmara, Festival Iberoamericano de Propaganda, em Buenos Aires, e até o Festival de Nova Iorque. Mas tem outros filminhos interessantes: deem uma olhada no primeiro Carrefour de Goiânia e o jeitão todo diferente com que eles faziam varejo. Vocês vão ver que muita coisa mudou: as verbas diminuíram, os clientes desapareceram, mas os publicitários parece que também resolveram dar a sua contribuição para que Goiás não ganhasse mais prêmios importantes, nacionais ou internacionais. Ou eu estou enganado?
Visitem este link e vejam alguns filmes deste escrevinhador de linhas tortas. O xodó da vovó é o primeiro comercial, do fósforo queimando, que seguramente foi uma das peças mais premiadas da propaganda de Goiás: festival de Gramado, prêmio Colunistas, prêmio Jaime Câmara, Festival Iberoamericano de Propaganda, em Buenos Aires, e até o Festival de Nova Iorque. Mas tem outros filminhos interessantes: deem uma olhada no primeiro Carrefour de Goiânia e o jeitão todo diferente com que eles faziam varejo. Vocês vão ver que muita coisa mudou: as verbas diminuíram, os clientes desapareceram, mas os publicitários parece que também resolveram dar a sua contribuição para que Goiás não ganhasse mais prêmios importantes, nacionais ou internacionais. Ou eu estou enganado?
8 1/2 = 10
Aí ele se perguntou, com sentimento de culpa e prostração diante da irreversibilidade, por que houvera deixado a vida passar sem ter tido aquela experiência? Estava claro que merecia imolação. Tanto se falou num mesmo tempo em culpa, prazer, otto e mezzo, nine. Tudo tão próximo, a vida ali e ele passando ao largo. Como podia?
8 1/2 tem um dos finais mais estupendos e surpreendentes da história do cinema. Guido Anselmi (Marcello Mastroianni), o cineasta em crise, dirige, ele próprio, a cena de sua vida, a ciranda na qual entram todos os personagens que viveram em conflito ao longo da sua história. O pai, a mãe, as diversas mulheres, o produtor, a igreja, as prostitutas, amigos e desafetos. Tudo se concilia, ao som de uma das fabulosas marchinhas circenses de Nino Rota.
Esse desfecho é uma epifania. Expressando o que sentia Fellini (Guido Anselmi não é mais que seu alter ego), vai ao encontro do sentimento mais íntimo do espectador. Afinal, quem já não sonhou em juntar pessoas e situações absolutamente inconciliáveis? A esposa e a amante. O pé no chão e o direito de sonhar. O resgate da figura materna e a pacificação com o personagem paterno. Pergunte a um psicanalista e ele dirá que essa soma de impossíveis vive, como desejo, no fundo do inconsciente de cada um. Por isso Fellini, com seu 8 1/2, toca tão fundo. A poucos filmes se aplica tão bem a frase latina de Horácio? De te fabula narratur. A história fala de você.
Fala, claro, de todos nós, pois essa é a universalidade da grande arte. Mas fala, também e especificamente, de uma situação vivida por Federico Fellini, e que qualquer artista enfrenta em determinado momento da sua trajetória - o chamado bloqueio criativo. Àquela altura do campeonato, Fellini havia dirigido um longa em parceria (Mulheres e Luzes, sua estreia, com Alberto Lattuada), seis longas-metragens-solo e dois episódios em filmes coletivos (O Amor na Cidade e Bocaccio 70). Em 1960, lançou uma das suas obras-primas, A Doce Vida, Palma de Ouro em Cannes, sucesso e escândalo mundiais, filme dos filmes, definitivo retrato de uma época e uma mentalidade.
O que fazer depois, sem a sensação de se repetir? Desafiado, Fellini cava em si mesmo e leva para a tela fantasmas e lembranças de infância, juventude e maturidade. Projeta essa memorialística imaginada em um personagem criado à sua maneira. Refaz sua história (real) através da ficção e sai da crise criativa… com o mais criativo filme de todos os tempos. Golpe de gênio. Fellini é como um faixa preta em judô que faz a força do oponente voltar-se contra ele próprio. Um detalhe engraçado é que os produtores queriam que ele separasse em cores e preto e branco as cenas da realidade e da fantasia para que o público as distinguisse. Fellini recusou. Para ele, os dois níveis da experiência humana eram equivalentes. Sonhar também é viver.
(texto do Luiz Zanin, do Estadão, para tentar redimir a culpa do culpado lá de cima)
8 1/2 tem um dos finais mais estupendos e surpreendentes da história do cinema. Guido Anselmi (Marcello Mastroianni), o cineasta em crise, dirige, ele próprio, a cena de sua vida, a ciranda na qual entram todos os personagens que viveram em conflito ao longo da sua história. O pai, a mãe, as diversas mulheres, o produtor, a igreja, as prostitutas, amigos e desafetos. Tudo se concilia, ao som de uma das fabulosas marchinhas circenses de Nino Rota.
Esse desfecho é uma epifania. Expressando o que sentia Fellini (Guido Anselmi não é mais que seu alter ego), vai ao encontro do sentimento mais íntimo do espectador. Afinal, quem já não sonhou em juntar pessoas e situações absolutamente inconciliáveis? A esposa e a amante. O pé no chão e o direito de sonhar. O resgate da figura materna e a pacificação com o personagem paterno. Pergunte a um psicanalista e ele dirá que essa soma de impossíveis vive, como desejo, no fundo do inconsciente de cada um. Por isso Fellini, com seu 8 1/2, toca tão fundo. A poucos filmes se aplica tão bem a frase latina de Horácio? De te fabula narratur. A história fala de você.
Fala, claro, de todos nós, pois essa é a universalidade da grande arte. Mas fala, também e especificamente, de uma situação vivida por Federico Fellini, e que qualquer artista enfrenta em determinado momento da sua trajetória - o chamado bloqueio criativo. Àquela altura do campeonato, Fellini havia dirigido um longa em parceria (Mulheres e Luzes, sua estreia, com Alberto Lattuada), seis longas-metragens-solo e dois episódios em filmes coletivos (O Amor na Cidade e Bocaccio 70). Em 1960, lançou uma das suas obras-primas, A Doce Vida, Palma de Ouro em Cannes, sucesso e escândalo mundiais, filme dos filmes, definitivo retrato de uma época e uma mentalidade.
O que fazer depois, sem a sensação de se repetir? Desafiado, Fellini cava em si mesmo e leva para a tela fantasmas e lembranças de infância, juventude e maturidade. Projeta essa memorialística imaginada em um personagem criado à sua maneira. Refaz sua história (real) através da ficção e sai da crise criativa… com o mais criativo filme de todos os tempos. Golpe de gênio. Fellini é como um faixa preta em judô que faz a força do oponente voltar-se contra ele próprio. Um detalhe engraçado é que os produtores queriam que ele separasse em cores e preto e branco as cenas da realidade e da fantasia para que o público as distinguisse. Fellini recusou. Para ele, os dois níveis da experiência humana eram equivalentes. Sonhar também é viver.
(texto do Luiz Zanin, do Estadão, para tentar redimir a culpa do culpado lá de cima)
O prazer e a culpa: e nós todos com isso
Sempre um texto. Sempre um texto da Folha. De tanto ler uma hora a gente acaba aprendendo. Sigam aí a linha de pensamento do Contardo Calligaris, psicanalista e autor do livro O conto do amor (muito bom, também), que escreve às quintas (não o livro, mas esta coluna). A de hoje chama-se O prazer e a culpa, sobre o que todos nós vivemos pensando, ainda que não percebamos. É a isto que se pode chamar de formação cultural.
Admirei a reação dos japoneses diante do desastre -terremoto, tsunami, contaminação nuclear. Nas declarações oficiais e nas palavras das vítimas, a catástrofe é apenas um acidente: pode haver responsáveis por falhas na prevenção, na segurança ou nos socorros, mas a catástrofe em si não tem sentido algum. Será que nós, ocidentais, seríamos capazes da mesma atitude? Não sei.
A peste assolou repetidamente a Europa do século 14 ao 18. A primeira grande epidemia, de 1347 a 1352, matou um quarto da população europeia. Para que o horror não induzisse ninguém a pensar que o universo era sem sentido, duas reações populares: 1) perseguir judeus e bruxas, supostamente responsáveis pelo contágio, 2) juntar-se aos flagelantes, penitentes que erravam pelo continente se fustigando até o sangue.
Para o flagelante, a peste era um castigo pelos pecados do mundo; portanto, punir-se por eles talvez fosse o jeito de tornar a peste desnecessária.
Naqueles quatro séculos, a Europa se cobriu de igrejas que eram construídas como oferendas para que a epidemia se acalmasse; nelas, homens e mulheres faziam promessas, pedindo para serem poupados.
Ainda hoje, na calamidade e no medo, a promessa que acompanha o pedido feito a Deus ou aos santos sempre propõe uma renúncia: o pedinte se engaja a se privar de algo, do sexo ao chocolate. Funciona assim: 1) meu prazer e meu gozo são sempre culpados, 2) portanto, qualquer mal que me assole se explica como punição de minhas culpas, 3) a renúncia aos meus prazeres pode me redimir e estancar a punição.
Como chegamos a fazer esse estranho uso dos prazeres, ou melhor, da renúncia aos nossos prazeres? Três respostas, não excludentes (e insuficientes).
1) Bem ou mal, educar implica conter, impor frustrações e renúncias. Com isso, a aprovação dos educadores sempre parece proporcional à aceitação das renúncias pelos educandos. Ou seja, os jovens podem ser levados a pensar que é só frustrando seus próprios desejos que eles ganham o amor dos adultos.
2) No fim do primeiro milênio, cada vila europeia vivia no medo de bandos errantes. Quando eles se aproximavam, o povo se reunia na igrejinha e rezava. Isso não impedia nem saques nem estupros. O que pensar quando os bandidos iam embora? Deus não nos protege porque não existe? Deus existe, mas não dá a menor para a gente? Devia triunfar a versão que conciliava o desastre com a existência de Deus: o próprio Deus mandou os bandidos para nos punir de nossos pecados.
3) Talvez seja menos angustiante viver num mundo que faz sentido do que num mundo que não teria sentido algum. Por exemplo, como é que você aguentaria o pensamento da morte futura sem o conforto da ideia de que ela está incluída numa ordem cósmica ou num plano divino?
Infelizmente, esse conforto tem um custo alto, pois o jeito mais fácil de garantir a existência de um sentido do mundo consiste em me atribuir a culpa por todos os males. Ou seja, minha culpa e meu esforço para me redimir "provam" que existe uma ordem (justamente, a que eu ofendia quando me entregava a meus prazeres).
Corolário: se meus prazeres culpados são a causa dos males, não preciso responder "adequadamente" às calamidades, bastará modificar minha conduta de modo que minhas ofensas sejam perdoadas.
Além de dar sentido ao meu mundo, a culpa me oferece a ilusão de agir de maneira eficaz: como o flagelante, posso esperar que minha renúncia ao prazer suspenda a punição. De repente, doenças e catástrofes talvez parem diante de minha conduta meritória. Em vez (ou além) de procurar as condições de prevenir um terremoto ou de debelar um câncer resistente, rezarei noite e dia e me fustigarei em penitência. Se, de qualquer forma, o terremoto vier ou o câncer triunfar, será porque não me açoitei o suficiente.
Pois bem, não acredito que, em nossa cultura, esse bizarro uso dos prazeres e da culpa tenha mudado substancialmente nos últimos sete séculos. Continuamos fundamentalmente inimigos do nosso prazer.
Prova disso: há, hoje como no século 14, bandos errantes que denunciam nossos tempos "hedonistas" e nossa voracidade por prazeres e gozos. São os flagelantes verbais: criticam o prazer para fomentar a culpa. É o jeito (custoso) que eles acharam para dar sentido ao mundo.
Admirei a reação dos japoneses diante do desastre -terremoto, tsunami, contaminação nuclear. Nas declarações oficiais e nas palavras das vítimas, a catástrofe é apenas um acidente: pode haver responsáveis por falhas na prevenção, na segurança ou nos socorros, mas a catástrofe em si não tem sentido algum. Será que nós, ocidentais, seríamos capazes da mesma atitude? Não sei.
A peste assolou repetidamente a Europa do século 14 ao 18. A primeira grande epidemia, de 1347 a 1352, matou um quarto da população europeia. Para que o horror não induzisse ninguém a pensar que o universo era sem sentido, duas reações populares: 1) perseguir judeus e bruxas, supostamente responsáveis pelo contágio, 2) juntar-se aos flagelantes, penitentes que erravam pelo continente se fustigando até o sangue.
Para o flagelante, a peste era um castigo pelos pecados do mundo; portanto, punir-se por eles talvez fosse o jeito de tornar a peste desnecessária.
Naqueles quatro séculos, a Europa se cobriu de igrejas que eram construídas como oferendas para que a epidemia se acalmasse; nelas, homens e mulheres faziam promessas, pedindo para serem poupados.
Ainda hoje, na calamidade e no medo, a promessa que acompanha o pedido feito a Deus ou aos santos sempre propõe uma renúncia: o pedinte se engaja a se privar de algo, do sexo ao chocolate. Funciona assim: 1) meu prazer e meu gozo são sempre culpados, 2) portanto, qualquer mal que me assole se explica como punição de minhas culpas, 3) a renúncia aos meus prazeres pode me redimir e estancar a punição.
Como chegamos a fazer esse estranho uso dos prazeres, ou melhor, da renúncia aos nossos prazeres? Três respostas, não excludentes (e insuficientes).
1) Bem ou mal, educar implica conter, impor frustrações e renúncias. Com isso, a aprovação dos educadores sempre parece proporcional à aceitação das renúncias pelos educandos. Ou seja, os jovens podem ser levados a pensar que é só frustrando seus próprios desejos que eles ganham o amor dos adultos.
2) No fim do primeiro milênio, cada vila europeia vivia no medo de bandos errantes. Quando eles se aproximavam, o povo se reunia na igrejinha e rezava. Isso não impedia nem saques nem estupros. O que pensar quando os bandidos iam embora? Deus não nos protege porque não existe? Deus existe, mas não dá a menor para a gente? Devia triunfar a versão que conciliava o desastre com a existência de Deus: o próprio Deus mandou os bandidos para nos punir de nossos pecados.
3) Talvez seja menos angustiante viver num mundo que faz sentido do que num mundo que não teria sentido algum. Por exemplo, como é que você aguentaria o pensamento da morte futura sem o conforto da ideia de que ela está incluída numa ordem cósmica ou num plano divino?
Infelizmente, esse conforto tem um custo alto, pois o jeito mais fácil de garantir a existência de um sentido do mundo consiste em me atribuir a culpa por todos os males. Ou seja, minha culpa e meu esforço para me redimir "provam" que existe uma ordem (justamente, a que eu ofendia quando me entregava a meus prazeres).
Corolário: se meus prazeres culpados são a causa dos males, não preciso responder "adequadamente" às calamidades, bastará modificar minha conduta de modo que minhas ofensas sejam perdoadas.
Além de dar sentido ao meu mundo, a culpa me oferece a ilusão de agir de maneira eficaz: como o flagelante, posso esperar que minha renúncia ao prazer suspenda a punição. De repente, doenças e catástrofes talvez parem diante de minha conduta meritória. Em vez (ou além) de procurar as condições de prevenir um terremoto ou de debelar um câncer resistente, rezarei noite e dia e me fustigarei em penitência. Se, de qualquer forma, o terremoto vier ou o câncer triunfar, será porque não me açoitei o suficiente.
Pois bem, não acredito que, em nossa cultura, esse bizarro uso dos prazeres e da culpa tenha mudado substancialmente nos últimos sete séculos. Continuamos fundamentalmente inimigos do nosso prazer.
Prova disso: há, hoje como no século 14, bandos errantes que denunciam nossos tempos "hedonistas" e nossa voracidade por prazeres e gozos. São os flagelantes verbais: criticam o prazer para fomentar a culpa. É o jeito (custoso) que eles acharam para dar sentido ao mundo.
quarta-feira, 23 de março de 2011
Vivendo e desaprendendo
A gente vai lá no tuíter e vê cada coisa curiosa: por exemplo, alunos e ex-alunos soltando a língua no curso superior que fazem ou fizeram. Descontada a minha ignorância e a clara liberdade de cada um dizer o que pensa, fico a me perguntar qual será a grande vantagem de expor em público a minha suposta má formação acadêmica. Será um daqueles acessos de sinceridade incontrolável? Os headhunters penhoradamente agradecem.
Obamão, nosso irmão
Quem assistiu o excesso de mesura de nossos governantes e convidados com a família real americana deve ter finalmente se convencido de que no Brasil, definitivamente, não existe preconceito de cor. Concorda ou vai querer levar uma bifa?
Dá cá o meu!
A propósito dos nepóticos: dois secretários (ou coisa que o valha) do governador têm parentes diretos pendurados em algum cargo. Outros devem ter arrumado soluções menos explícitas. Alguém aí vai querer mudar alguma coisa?
Corra, Perillo, corra!
Pego muito no pé de quem trabalha com comunicação, como eu. Pego no meu próprio pé, portanto. Mas há vezes em que é preciso enaltecer os seus feitos. Vejam que de uns tempos pra cá, surpreendentemente, o jornal O Popular, de Goiânia, resolveu fazer jornalismo. E publicou uma grande matéria sobre nepotismo no governo estadual. Pra quê? O governador Perillo, todo muderninho, correu, correu e hoje já anunciou a próxima exoneração de 7.000 funcionários comissionados do Estado. Tudo muito bonitinho, mas pouco profundo. Visto por outro lado, está claro aí o câncer da política no Brasil como um todo: é um eterno arranjo de interesses entre os que detêm um poder e os seus eternos apaniguados e subservientes. E a comunicação, onde entra? Elementar, meus caros uótsons: se não fosse o jornal publicar, vocês acham que alguém tomaria alguma providência?
É otimismo dimais da cuonta...
Ontem, de manhãzinha, chuvinha de ficar na cama, bateria do carro a zero; hoje, de manhãzinha, chuvinha de ficar na cama, mesmo pneu furado duas vezes. Lembra ou não lembra aquela história do otimista e do pessimista? O pessimista: "ah, não, tudo acontece comigo"; o otimista: "oba, tem coisa boa vindo por aí..."
terça-feira, 22 de março de 2011
Não tenho nada com isso, só estou falando...
Houve um dia um presidente no Brasil, um tal de Lula, que tanto fez até conseguir chegar lá. Entrou pra história com uma popularidade irritante de tão incostestável. Saiu de lá depois de eleger a sucessora. Chegou onde chegou muito por causa da mídia, que morria de amores pelo seu jeitão meio matuto, lingua presa, cara de peão pretensioso. Agora vive às turras com a mesma mídia, ele com aquele seu jeitão de matuto depois de um banho de personal style, mas a mídia com jeitão de rancor de dar nos nervos. Ok, todos sabemos que o Brasil não é para principiantes, como disse alguém, que o sucesso no Brasil é ofensa pessoal, como disse o outro, mas será que não dá pra pelo menos disfarçar um pouquinho da inveja tão evidente. A propósito, se pudesse, Lula indicaria a todos a leitura do livro Mal Secreto, do Zuenir Ventura. É fininho, até o Lula conseguiria ler.
Para ninguém dizer que eu também não disse
Minha coluna na http://www.revistacidades.com.br/. Ufa, finalmente um texto de própria lavra.
É DURA A VIDA
Está aí uma frase que vale para todos, variando apenas o grau de intensidade entre uns e outros. No caso específico dos jornalistas, digamos que a dureza deve ser um pouco maior, já que não deve ser nada fácil produzir tanto texto diariamente sem o risco de cometer deslizes, injustiças e verdades incompletas.
UM EXEMPLO?
Na tragédia do Japão, de números intermináveis, a primeira "onda" jornalística tendia para um arremedo de
elogio pelo pequeno número de mortos dos primeiros dias. As contas batiam em 300 vítimas, o que era
resultado do preparo de todos para eventos desta monta. Os dias foram passando e os números, natural e
infelizmente, foram sendo multiplicados por centenas. Não era hora, é certo, de calcular friamente, mas era
bastante possível prever que, diante daquele cenário de Dante, não cabia um otimismo tão grande.
OUTRO EXEMPLO
Outra questão jornalística acerca do Japão. Dois dias depois da tsunami, Montanaro, chargista da prestigiada página 2 da Folha de São Paulo, publicou um desenho que reproduzia uma imensa onda que arrastava a tudo e a todos, baseando-se em uma xilogravura famosa de um autor japonês. Foi o suficiente: repetiu-se, a partir daí, a pegadinha mais manjada do mundo da comunicação. Os leitores reagiram positiva e negativamente, gerou-se uma polêmica, ocupou-se espaço e tempo muito além do necessário para chegar a absolutamente nada. Certamente é a isso que a mídia chama de "espaço democrático de debates". Acho que não é bem assim.
JORNALISMO OU PUBLICIDADE?
Quem está mais certo é Leandro Marshall, autor do livro "O jornalismo na era da publicidade" (Summus, 2003), quando diz que editores passaram a se autocensurar e a produzir apenas reportagens que rendam audiência, tiragem e lucro. Acho que é bem assim.
EM TEMPO
"O jornalismo moderno tem uma coisa a seu favor. Ao nos oferecer a opinião dos deseducados, ele mantém-nos em dia com a ignorância da comunidade." Oscar Wilde, numa frase nada recente, mas muito atual.
É DURA A VIDA
Está aí uma frase que vale para todos, variando apenas o grau de intensidade entre uns e outros. No caso específico dos jornalistas, digamos que a dureza deve ser um pouco maior, já que não deve ser nada fácil produzir tanto texto diariamente sem o risco de cometer deslizes, injustiças e verdades incompletas.
UM EXEMPLO?
Na tragédia do Japão, de números intermináveis, a primeira "onda" jornalística tendia para um arremedo de
elogio pelo pequeno número de mortos dos primeiros dias. As contas batiam em 300 vítimas, o que era
resultado do preparo de todos para eventos desta monta. Os dias foram passando e os números, natural e
infelizmente, foram sendo multiplicados por centenas. Não era hora, é certo, de calcular friamente, mas era
bastante possível prever que, diante daquele cenário de Dante, não cabia um otimismo tão grande.
OUTRO EXEMPLO
Outra questão jornalística acerca do Japão. Dois dias depois da tsunami, Montanaro, chargista da prestigiada página 2 da Folha de São Paulo, publicou um desenho que reproduzia uma imensa onda que arrastava a tudo e a todos, baseando-se em uma xilogravura famosa de um autor japonês. Foi o suficiente: repetiu-se, a partir daí, a pegadinha mais manjada do mundo da comunicação. Os leitores reagiram positiva e negativamente, gerou-se uma polêmica, ocupou-se espaço e tempo muito além do necessário para chegar a absolutamente nada. Certamente é a isso que a mídia chama de "espaço democrático de debates". Acho que não é bem assim.
JORNALISMO OU PUBLICIDADE?
Quem está mais certo é Leandro Marshall, autor do livro "O jornalismo na era da publicidade" (Summus, 2003), quando diz que editores passaram a se autocensurar e a produzir apenas reportagens que rendam audiência, tiragem e lucro. Acho que é bem assim.
EM TEMPO
"O jornalismo moderno tem uma coisa a seu favor. Ao nos oferecer a opinião dos deseducados, ele mantém-nos em dia com a ignorância da comunidade." Oscar Wilde, numa frase nada recente, mas muito atual.
Como eu queria dizer, o que vale é a palavra
Como disse o Clóvis Rossi, na Folha de ontem.
Vou ser teimoso e ainda torcer para que o discurso do presidente Barack Obama, hoje, no Rio, seja de fato capaz de produzir uma conexão entre ele e a sociedade brasileira, ou, ao menos, a parte da sociedade brasileira que se interessa por essas coisas.
Passo por cima da parte oficial da visita, que estava apenas começando enquanto escrevia, porque essa fatia é sempre acertada antes. Não promete nada de extraordinário, até porque as relações Brasil/Estados Unidos estão no ouro sobre azul desde as gestões Fernando Henrique Cardoso/Bill Clinton, passando por Lula/Bush (o melhor ponto) e assim seguindo com Lula/ Obama.
Rusgas, houve. Mas, do meu ponto de vista, bem menores do que o Fla-Flu que uma parte da mídia gosta de introduzir nas relações internacionais. Além disso, "não há relações perfeitas" entre países, quaisquer que sejam, como ensina Shannon O'Neil, especialista em América Latina do Council on Foreign Relations.
Mesmo no caso do Irã, a diplomacia brasileira seguiu basicamente o discutido com a Casa Branca. Se algo deu errado, foi culpa de um erro de cálculo do Departamento de Estado sobre a aceitação pelo Irã da proposta turco-brasileira a respeito do enriquecimento de urânio no exterior.
Ou seja, se houve irritação, ela deveria ter sido maior do lado brasileiro do que do americano.
Voltemos, pois, ao discurso. Barack Obama é rematado mestre nessa arte. Fez para os muçulmanos, no Cairo e para os europeus, em Berlim (antes ainda da vitória), discursos memoráveis pelo engajamento prometido e pela compreensão demonstrada das peculiaridades de cada tribo.
É verdade que, depois, o vento levou as palavras. Mesmo assim, espero que toque na corda certa hoje, ainda que o efeito seja efêmero. Tudo no mundo de hoje é assim.
Vou ser teimoso e ainda torcer para que o discurso do presidente Barack Obama, hoje, no Rio, seja de fato capaz de produzir uma conexão entre ele e a sociedade brasileira, ou, ao menos, a parte da sociedade brasileira que se interessa por essas coisas.
Passo por cima da parte oficial da visita, que estava apenas começando enquanto escrevia, porque essa fatia é sempre acertada antes. Não promete nada de extraordinário, até porque as relações Brasil/Estados Unidos estão no ouro sobre azul desde as gestões Fernando Henrique Cardoso/Bill Clinton, passando por Lula/Bush (o melhor ponto) e assim seguindo com Lula/ Obama.
Rusgas, houve. Mas, do meu ponto de vista, bem menores do que o Fla-Flu que uma parte da mídia gosta de introduzir nas relações internacionais. Além disso, "não há relações perfeitas" entre países, quaisquer que sejam, como ensina Shannon O'Neil, especialista em América Latina do Council on Foreign Relations.
Mesmo no caso do Irã, a diplomacia brasileira seguiu basicamente o discutido com a Casa Branca. Se algo deu errado, foi culpa de um erro de cálculo do Departamento de Estado sobre a aceitação pelo Irã da proposta turco-brasileira a respeito do enriquecimento de urânio no exterior.
Ou seja, se houve irritação, ela deveria ter sido maior do lado brasileiro do que do americano.
Voltemos, pois, ao discurso. Barack Obama é rematado mestre nessa arte. Fez para os muçulmanos, no Cairo e para os europeus, em Berlim (antes ainda da vitória), discursos memoráveis pelo engajamento prometido e pela compreensão demonstrada das peculiaridades de cada tribo.
É verdade que, depois, o vento levou as palavras. Mesmo assim, espero que toque na corda certa hoje, ainda que o efeito seja efêmero. Tudo no mundo de hoje é assim.
As marcas da diplomacia, segundo o Nizan
Tá lá na Folha de hoje. Leiam lá e cá. Comentem. Discutam. Vivam.
Smos um país de criativos. Da tristeza criamos samba, do descontrole econômico, nosso vigor econômico, da ditadura militar, uma democracia pacífica.
Do ciclo atual de desenvolvimento estamos criando o quê? Um novo país, com certeza.
O desenvolvimento econômico dos últimos anos transforma da demografia à diplomacia. E transforma também a propaganda.
O ciclo da produção publicitária é muito mais rápido do que o de outras formas de expressão formadoras de opinião. Ela muitas vezes traduz e expressa primeiro as transformações do país.
As imagens e o espírito do novo Brasil já povoam os novos reclames com os novos consumidores.
O mercado brasileiro, finalmente, ganhou dinamismo includente. Investimentos maciços estão sendo feitos para atender e entreter os novos entrantes no mercado consumidor.
E o IBGE diz todo mês que os salários não param de subir.
Essa transformação é também geográfica. A riqueza chega a algumas regiões do país nunca antes desenvolvidas. E leva junto a propaganda. Por exemplo, na expansão da frota de carros nacional, setor de publicidade intensiva.
Cidades do Norte e do Nordeste e de regiões agrícolas interiores lideram o sólido crescimento das vendas. De 2007 a 2010, elas cresceram 42% na média nacional. Mas explodiram mesmo em lugares como Uberaba (93%), Uberlândia (87%), Teresina (74%). O investimento em publicidade nes- ses mercados acompanha.
Mas não para por aí.
A essa nova fronteira interna, tão grande quanto promissora, junta-se o mercado global, que se abre à nossa propaganda na medida em que nossas empresas e marcas respiram lá fora.
Que responsabilidade formar nossas marcas no exterior. Marcas globais são embaixadoras por natureza, muitas vezes mais próximas dos habitantes de um país estrangeiro do que qualquer estratégia de política externa.
Assim como a imagem dos americanos, dos japoneses, dos alemães e dos suíços no estrangeiro está muito associada à imagem de suas marcas, o mesmo acontecerá com o Brasil.
Como num roteiro bem escrito, esse duplo chamamento à propaganda brasileira, interno e externo, acontece num momento em que a indústria está forte, preparada e prosperando. E sendo disputada a peso de ouro pelos grandes grupos internacionais.
Nossa geração conseguiu tirar a propaganda de dentro do mundo da propaganda. Com o esforço de gente de visão clara como Luiz Lara, Marcelo Serpa, Washington Olivetto e Júlio Ribeiro, ela ganhou gravidade e passou a frequentar as páginas dos cadernos de economia da grande imprensa.
A propaganda brasileira primeiro se consolidou como construtora de marcas. Depois, veio o reconhecimento internacional com os prêmios nos festivais. Agora, o desafio é tornar a propaganda brasileira global. Ela tem de ser competitiva não só dentro do Brasil, mas de Nova York a Xangai.
Então é muito bom, mas não é nada fácil. E quem não andar, não vai chegar.
É crescer para dentro do Brasil, e expansão digital pelo mundo, porque a expansão global é digital. Ponto.
E é preciso também network. O mundo hoje é relacionamento. Fico triste ao ver tão poucos empresários e empresas brasileiras em fóruns globais como o de Davos.
Não podemos mais perder essas oportunidades porque, se não abraçarmos o mundo, o mundo vai nos abraçar.
Daqui a três anos, teremos a atenção do planeta todo por um mês, na Copa do Mundo de 2014. Dois anos depois, será a vez da Olimpíada do Rio de Janeiro.
Jogaremos em casa nas duas maiores partidas de "branding" global. Não podemos perder. Nem empatar.
Além das obras de infraestrutura para as duas competições, precisamos construir as marcas do Brasil e suas empresas.
Os atributos da nação, conciliadora, alegre e trabalhadora, são o mapa do caminho.
Smos um país de criativos. Da tristeza criamos samba, do descontrole econômico, nosso vigor econômico, da ditadura militar, uma democracia pacífica.
Do ciclo atual de desenvolvimento estamos criando o quê? Um novo país, com certeza.
O desenvolvimento econômico dos últimos anos transforma da demografia à diplomacia. E transforma também a propaganda.
O ciclo da produção publicitária é muito mais rápido do que o de outras formas de expressão formadoras de opinião. Ela muitas vezes traduz e expressa primeiro as transformações do país.
As imagens e o espírito do novo Brasil já povoam os novos reclames com os novos consumidores.
O mercado brasileiro, finalmente, ganhou dinamismo includente. Investimentos maciços estão sendo feitos para atender e entreter os novos entrantes no mercado consumidor.
E o IBGE diz todo mês que os salários não param de subir.
Essa transformação é também geográfica. A riqueza chega a algumas regiões do país nunca antes desenvolvidas. E leva junto a propaganda. Por exemplo, na expansão da frota de carros nacional, setor de publicidade intensiva.
Cidades do Norte e do Nordeste e de regiões agrícolas interiores lideram o sólido crescimento das vendas. De 2007 a 2010, elas cresceram 42% na média nacional. Mas explodiram mesmo em lugares como Uberaba (93%), Uberlândia (87%), Teresina (74%). O investimento em publicidade nes- ses mercados acompanha.
Mas não para por aí.
A essa nova fronteira interna, tão grande quanto promissora, junta-se o mercado global, que se abre à nossa propaganda na medida em que nossas empresas e marcas respiram lá fora.
Que responsabilidade formar nossas marcas no exterior. Marcas globais são embaixadoras por natureza, muitas vezes mais próximas dos habitantes de um país estrangeiro do que qualquer estratégia de política externa.
Assim como a imagem dos americanos, dos japoneses, dos alemães e dos suíços no estrangeiro está muito associada à imagem de suas marcas, o mesmo acontecerá com o Brasil.
Como num roteiro bem escrito, esse duplo chamamento à propaganda brasileira, interno e externo, acontece num momento em que a indústria está forte, preparada e prosperando. E sendo disputada a peso de ouro pelos grandes grupos internacionais.
Nossa geração conseguiu tirar a propaganda de dentro do mundo da propaganda. Com o esforço de gente de visão clara como Luiz Lara, Marcelo Serpa, Washington Olivetto e Júlio Ribeiro, ela ganhou gravidade e passou a frequentar as páginas dos cadernos de economia da grande imprensa.
A propaganda brasileira primeiro se consolidou como construtora de marcas. Depois, veio o reconhecimento internacional com os prêmios nos festivais. Agora, o desafio é tornar a propaganda brasileira global. Ela tem de ser competitiva não só dentro do Brasil, mas de Nova York a Xangai.
Então é muito bom, mas não é nada fácil. E quem não andar, não vai chegar.
É crescer para dentro do Brasil, e expansão digital pelo mundo, porque a expansão global é digital. Ponto.
E é preciso também network. O mundo hoje é relacionamento. Fico triste ao ver tão poucos empresários e empresas brasileiras em fóruns globais como o de Davos.
Não podemos mais perder essas oportunidades porque, se não abraçarmos o mundo, o mundo vai nos abraçar.
Daqui a três anos, teremos a atenção do planeta todo por um mês, na Copa do Mundo de 2014. Dois anos depois, será a vez da Olimpíada do Rio de Janeiro.
Jogaremos em casa nas duas maiores partidas de "branding" global. Não podemos perder. Nem empatar.
Além das obras de infraestrutura para as duas competições, precisamos construir as marcas do Brasil e suas empresas.
Os atributos da nação, conciliadora, alegre e trabalhadora, são o mapa do caminho.
Pondé, grande provocador de textos e ideias
Sempre que puder e me lembrar - toda segunda, portanto - vou copiar pra cá as colunas deste cara - Luiz Fernando Pondé, acho que psicanalista em São Paulo - e que publica na Folha textos belíssimos sobre a alma e o âmago humano. Neste, de ontem, ele parte do Japão e sua tragédia e vai terminar na questão da libido e do sexo, nem acesso de inteligência mordaz que dá inveja. Leiam, reflitam, escrevam como eu vou tentar pra ver se aproximo de tanto. O título, também belo: O delicioso perfume de Emma Bovary.
De fato, uma tragédia no Japão! Mas o povo japonês é um grande povo, estoico, maravilhoso, e vai dar uma lição ao mundo, mais uma vez, de como enfrentar a dureza da vida sem frescuras. Confio nos samurais contra esta bela besta-fera que é a natureza.
Claro que o bloco dos 2012 maníacos pelo fim do mundo vai dizer que a "mãe Terra" (que está mais pra Medeia do que pra Gaia) está nos mandando um recado, mas isso é bobagem, a natureza é cega. Não faço parte dos fanáticos "believers da religião verde". Sou um herege. Os "nature lovers" sabem que câncer é natural?
Sou mais dado a assuntos "menores", do tipo que enche o consultório dos analistas e nossas camas sujas.
"O que você acha da culpa e da traição?", me perguntou, outro dia, uma jornalista, um tanto ansiosa. Senti o delicioso perfume de Emma Bovary no ar.
Sei que pode haver culpa, mas o que me espanta mais é a ideia contemporânea de que haja uma "redenção pelo sexo".
Antes de tudo, não entendo a culpa como uma "ideia da consciência moral". Acho que quando a filosofia pensa a culpa como uma "ideia da consciência moral", ela faz má filosofia.
A culpa é mais um sentimento difuso que vai do fígado ao coração, assombrando o cérebro, escurecendo a visão, um zumbido nos ouvidos, que faz do mundo opaco. Uma ameaça que inunda o sangue.
Como uma náusea que não se sabe de qual órgão do corpo vem, nem para qual faculdade da alma se dirige. Um afeto incômodo, mas que faz você sentir que ainda tem corpo e alma, como numa intoxicação que paralisa o cotidiano.
Por isso usamos expressões como "ressaca moral". A culpa inunda o sangue, contaminando-o como faz o vinho, deixando um gosto de borracha na boca e a língua azeda.
Um erro comum é a fantasia de que uma vida sexual "louca" cura a alma de sua insatisfação cotidiana. Não, uma vida sexual "louca" é marca de uma alma louca de desejo. Nada mais. Como qualquer tara, é repetitiva, monótona, banal. Um vício, como o jogo, a cocaína, o álcool. Uma loucura humana demasiado humana, mas não sinal de uma nova atitude libertadora.
Só pessoas que vivem sonhando, pensando na maravilha que seria ser uma Emma Bovary, sem nunca ter pecado, sem nunca sentir o gosto de uma cama suja na boca, imagina que haja redenção no desejo sexual "emancipado".
Não digo isso pra negar o valor de se realizar desejos. Longe de mim a crença na armadilha do velho puritanismo. Deixo o puritanismo para as militantes da "pureza da natureza feminina" e para esses maníacos pela alimentação "sem sangue".
Digo isso para refutar a ideia infantil de que haja redenção no sexo ou em qualquer outra forma do desejo humano.
O ciclo do desejo é um círculo infinito cuja esfera está em toda parte e o centro em parte alguma. Este movimento descreve o sem-fim do inferno humano.
O desejo é sempre triste. Apenas quem não o conhece o julga redentor. A revolução sexual é puro marketing de comportamento. Venda de "estilos e produtos de prazer". Sua verborragia é indício de sua nulidade. Nossos avós faziam sexo melhor do que nós e nossos filhos que se gabam de beijar dezenas numa noite. O pecado é que dá tesão e não a liberdade sexual.
Uma das marcas do ridículo de nossa época é levar os jovens a sério demais. Atitude típica de covarde que foge da responsabilidade de dizer aos mais jovens que não há solução para vida e que tudo o que eles pensam já foi pensado antes deles e melhor.
A vida nasce, é bela, floresce, adoece e morre, sendo esquecida em meio aos vermes. E fazemos o que podemos em meio a isso.
Espanta-me como tanta gente grita dizendo que não vai ter água e comida pra todo mundo. Acho que o que vai acabar antes é a libido diante de tamanha masturbação sobre como ela salva a vida da sensação de nulidade cotidiana. Não vai sobrar libido para todo mundo, já que todo mundo deve ser um campeão do sexo.
Não existe sexo de graça (livre). A forma mais barata ainda é pagar com dinheiro ou um jantar. Daí o sucesso eterno da prostituição, porque sua nudez é ainda a mais em conta. Ou se paga com dinheiro ou com a alma.
De fato, uma tragédia no Japão! Mas o povo japonês é um grande povo, estoico, maravilhoso, e vai dar uma lição ao mundo, mais uma vez, de como enfrentar a dureza da vida sem frescuras. Confio nos samurais contra esta bela besta-fera que é a natureza.
Claro que o bloco dos 2012 maníacos pelo fim do mundo vai dizer que a "mãe Terra" (que está mais pra Medeia do que pra Gaia) está nos mandando um recado, mas isso é bobagem, a natureza é cega. Não faço parte dos fanáticos "believers da religião verde". Sou um herege. Os "nature lovers" sabem que câncer é natural?
Sou mais dado a assuntos "menores", do tipo que enche o consultório dos analistas e nossas camas sujas.
"O que você acha da culpa e da traição?", me perguntou, outro dia, uma jornalista, um tanto ansiosa. Senti o delicioso perfume de Emma Bovary no ar.
Sei que pode haver culpa, mas o que me espanta mais é a ideia contemporânea de que haja uma "redenção pelo sexo".
Antes de tudo, não entendo a culpa como uma "ideia da consciência moral". Acho que quando a filosofia pensa a culpa como uma "ideia da consciência moral", ela faz má filosofia.
A culpa é mais um sentimento difuso que vai do fígado ao coração, assombrando o cérebro, escurecendo a visão, um zumbido nos ouvidos, que faz do mundo opaco. Uma ameaça que inunda o sangue.
Como uma náusea que não se sabe de qual órgão do corpo vem, nem para qual faculdade da alma se dirige. Um afeto incômodo, mas que faz você sentir que ainda tem corpo e alma, como numa intoxicação que paralisa o cotidiano.
Por isso usamos expressões como "ressaca moral". A culpa inunda o sangue, contaminando-o como faz o vinho, deixando um gosto de borracha na boca e a língua azeda.
Um erro comum é a fantasia de que uma vida sexual "louca" cura a alma de sua insatisfação cotidiana. Não, uma vida sexual "louca" é marca de uma alma louca de desejo. Nada mais. Como qualquer tara, é repetitiva, monótona, banal. Um vício, como o jogo, a cocaína, o álcool. Uma loucura humana demasiado humana, mas não sinal de uma nova atitude libertadora.
Só pessoas que vivem sonhando, pensando na maravilha que seria ser uma Emma Bovary, sem nunca ter pecado, sem nunca sentir o gosto de uma cama suja na boca, imagina que haja redenção no desejo sexual "emancipado".
Não digo isso pra negar o valor de se realizar desejos. Longe de mim a crença na armadilha do velho puritanismo. Deixo o puritanismo para as militantes da "pureza da natureza feminina" e para esses maníacos pela alimentação "sem sangue".
Digo isso para refutar a ideia infantil de que haja redenção no sexo ou em qualquer outra forma do desejo humano.
O ciclo do desejo é um círculo infinito cuja esfera está em toda parte e o centro em parte alguma. Este movimento descreve o sem-fim do inferno humano.
O desejo é sempre triste. Apenas quem não o conhece o julga redentor. A revolução sexual é puro marketing de comportamento. Venda de "estilos e produtos de prazer". Sua verborragia é indício de sua nulidade. Nossos avós faziam sexo melhor do que nós e nossos filhos que se gabam de beijar dezenas numa noite. O pecado é que dá tesão e não a liberdade sexual.
Uma das marcas do ridículo de nossa época é levar os jovens a sério demais. Atitude típica de covarde que foge da responsabilidade de dizer aos mais jovens que não há solução para vida e que tudo o que eles pensam já foi pensado antes deles e melhor.
A vida nasce, é bela, floresce, adoece e morre, sendo esquecida em meio aos vermes. E fazemos o que podemos em meio a isso.
Espanta-me como tanta gente grita dizendo que não vai ter água e comida pra todo mundo. Acho que o que vai acabar antes é a libido diante de tamanha masturbação sobre como ela salva a vida da sensação de nulidade cotidiana. Não vai sobrar libido para todo mundo, já que todo mundo deve ser um campeão do sexo.
Não existe sexo de graça (livre). A forma mais barata ainda é pagar com dinheiro ou um jantar. Daí o sucesso eterno da prostituição, porque sua nudez é ainda a mais em conta. Ou se paga com dinheiro ou com a alma.
De como da morte brota a vida
Da Folha de hoje, também. Do Rubem Alves. Os textos bastam por si. Basta de mim.
E o cadáver que você plantou no seu jardim, já começou a brotar? Pode ser que cada sepultura seja um jardim!"
Sou antropófago. Devoro livros. Quem me ensinou foi Murilo Mendes: livros são feitos com a carne e o sangue dos que os escreveram. Os hábitos de antropófago determinam a maneira como escolho livros.
Só leio livros escritos com sangue. Depois que os devoro deixam de pertencer ao autor. São meus porque circulam na minha carne e no meu sangue.
É o caso do conto "O afogado mais bonito do mundo", de Gabriel Garcia Marquez. Ele escreveu. Eu li e devorei. Agora é meu. Eu o reconto.
É sobre uma vila de pescadores perdida em um nenhum lugar, o enfado misturado com o ar, cada novo dia já nascendo velho, as mesmas palavras ocas, os mesmos gestos vazios, os mesmos corpos opacos, a excitação do amor sendo algo de que ninguém mais se lembrava...
Aconteceu que, num dia como todos os outros, um menino viu uma forma estranha flutuando longe no mar. E ele gritou. Todos correram. Num lugar como aquele até uma forma estranha é motivo de festa. E ali ficaram na praia, olhando, esperando. Até que o mar, sem pressa, trouxe a coisa e a colocou na areia, para o desapontamento de todos: era um homem morto.
Todos os homens mortos são parecidos porque há apenas uma coisa a se fazer com eles: enterrar. E naquela vila o costume era que as mulheres preparassem os mortos para o sepultamento. Assim, carregaram o cadáver para uma casa, as mulheres dentro, os homens fora. E o silêncio era grande enquanto o limpavam das algas e liquens, mortalhas verdes do mar.
Mas, repentinamente, uma voz quebrou o silêncio. Uma mulher balbuciou: "Se ele tivesse vivido entre nós, ele teria de ter curvado a cabeça sempre ao entrar em nossas casas. Ele é muito alto...".
Todas as mulheres, sérias e silenciosas, fizeram sim com a cabeça.
De novo o silêncio profundo, até que outra voz foi ouvida. Outra mulher... "Fico pensando em como teria sido a sua voz... Como o sussurro da brisa? Como o trovão das ondas? Será que ele conhecia aquela palavra secreta que, quando pronunciada, faz com que uma mulher apanhe uma flor e a coloque no cabelo?"
E elas sorriram e olharam umas para as outras.
De novo o silêncio. E, de novo, a voz de outra mulher... "Essas mãos... Como são grandes! Que será que fizeram? Brincaram com crianças? Navegaram mares? Travaram batalhas? Construíram casas? Essas mãos: será que elas sabiam deslizar sobre o rosto de uma mulher, será que elas sabiam abraçar e acariciar o seu corpo?"
Aí todas elas riram que riram, suas faces vermelhas, e se surpreenderam ao perceber que o enterro estava se transformando numa ressurreição: um movimento nas suas carnes, sonhos esquecidos, que pensavam mortos, retornavam, cinzas virando fogo, desejos proibidos aparecendo na superfície de sua pele, os corpos vivos de novo e os rostos opacos brilhando com a luz da alegria.
Os maridos, de fora, observavam o que estava acontecendo e ficaram com ciúmes do afogado, ao perceberem que um morto tinha um poder que eles mesmos não tinham mais. E pensaram nos sonhos que nunca haviam tido, nos poemas que nunca haviam escrito, nos mares que nunca tinham navegado, nas mulheres que nunca haviam desejado.
A estória termina dizendo que finalmente enterraram o morto. Mas a aldeia nunca mais foi a mesma...
Depois dos terremotos e tsunamis nosso mundo nunca mais será o mesmo...
E o cadáver que você plantou no seu jardim, já começou a brotar? Pode ser que cada sepultura seja um jardim!"
Sou antropófago. Devoro livros. Quem me ensinou foi Murilo Mendes: livros são feitos com a carne e o sangue dos que os escreveram. Os hábitos de antropófago determinam a maneira como escolho livros.
Só leio livros escritos com sangue. Depois que os devoro deixam de pertencer ao autor. São meus porque circulam na minha carne e no meu sangue.
É o caso do conto "O afogado mais bonito do mundo", de Gabriel Garcia Marquez. Ele escreveu. Eu li e devorei. Agora é meu. Eu o reconto.
É sobre uma vila de pescadores perdida em um nenhum lugar, o enfado misturado com o ar, cada novo dia já nascendo velho, as mesmas palavras ocas, os mesmos gestos vazios, os mesmos corpos opacos, a excitação do amor sendo algo de que ninguém mais se lembrava...
Aconteceu que, num dia como todos os outros, um menino viu uma forma estranha flutuando longe no mar. E ele gritou. Todos correram. Num lugar como aquele até uma forma estranha é motivo de festa. E ali ficaram na praia, olhando, esperando. Até que o mar, sem pressa, trouxe a coisa e a colocou na areia, para o desapontamento de todos: era um homem morto.
Todos os homens mortos são parecidos porque há apenas uma coisa a se fazer com eles: enterrar. E naquela vila o costume era que as mulheres preparassem os mortos para o sepultamento. Assim, carregaram o cadáver para uma casa, as mulheres dentro, os homens fora. E o silêncio era grande enquanto o limpavam das algas e liquens, mortalhas verdes do mar.
Mas, repentinamente, uma voz quebrou o silêncio. Uma mulher balbuciou: "Se ele tivesse vivido entre nós, ele teria de ter curvado a cabeça sempre ao entrar em nossas casas. Ele é muito alto...".
Todas as mulheres, sérias e silenciosas, fizeram sim com a cabeça.
De novo o silêncio profundo, até que outra voz foi ouvida. Outra mulher... "Fico pensando em como teria sido a sua voz... Como o sussurro da brisa? Como o trovão das ondas? Será que ele conhecia aquela palavra secreta que, quando pronunciada, faz com que uma mulher apanhe uma flor e a coloque no cabelo?"
E elas sorriram e olharam umas para as outras.
De novo o silêncio. E, de novo, a voz de outra mulher... "Essas mãos... Como são grandes! Que será que fizeram? Brincaram com crianças? Navegaram mares? Travaram batalhas? Construíram casas? Essas mãos: será que elas sabiam deslizar sobre o rosto de uma mulher, será que elas sabiam abraçar e acariciar o seu corpo?"
Aí todas elas riram que riram, suas faces vermelhas, e se surpreenderam ao perceber que o enterro estava se transformando numa ressurreição: um movimento nas suas carnes, sonhos esquecidos, que pensavam mortos, retornavam, cinzas virando fogo, desejos proibidos aparecendo na superfície de sua pele, os corpos vivos de novo e os rostos opacos brilhando com a luz da alegria.
Os maridos, de fora, observavam o que estava acontecendo e ficaram com ciúmes do afogado, ao perceberem que um morto tinha um poder que eles mesmos não tinham mais. E pensaram nos sonhos que nunca haviam tido, nos poemas que nunca haviam escrito, nos mares que nunca tinham navegado, nas mulheres que nunca haviam desejado.
A estória termina dizendo que finalmente enterraram o morto. Mas a aldeia nunca mais foi a mesma...
Depois dos terremotos e tsunamis nosso mundo nunca mais será o mesmo...
Cony, um botão e o mundo
Saiu hoje na Folha, e não me furtaria a copiar para cá este texto do Cony, com a singeleza e a rabugice que ele costuma coloca no que escreve. Mais do que isso, foi o texto - junto com um tanto de outros, que tomei emprestados para tentar voltar a ser mais assíduo aqui neste minifúndio de ideias bem escritas, ou às vezes nem tanto. Mais: foram os textos com os quais eu resolvi mudar o nome do bloguinho, para www.sereninicas.blogspot.com, na tentativa vã de ter mais visitas. Menos por mim, mais pelos textos, como este do Cony:
Nada entendo de foguetes espaciais, o que não chega a ser vantagem, pois nada entendo de tudo. Fiquei sabendo que entre as causas possíveis de um desastre, uma delas seria a invasão casual ou proposital nos computadores que monitoram os complicados lançamentos.
Lembro a prisão de um rapaz gorducho, óculos fundo de garrafa, tipo que antigamente a gente chamava de "bolão do Vasco". O sujeito, mal saído da adolescência, criara um vírus que infectara milhões de computadores em todo o mundo.
Sempre me preocupei com a ideia de um botão que pudesse acabar não apenas com o mundo, mas com o universo inteiro. Alguma coisa parecida com aquela campainha que o personagem de Eça de Queiroz tocou e matou um mandarim na China, que a quilômetros de distância, vestido em sua túnica amarela, estava empinando um papagaio e caiu fulminado, deixando fabulosa fortuna para o obscuro funcionário de Lisboa.
No tempo de Eça, isso seria impossível. Mas agora, no meu tempo, é uma possibilidade que me fascina e angustia. Ninguém precisa temer que eu faça uma besteira dessas, não por virtude, mas por ignorância. Do mundo digital sei o básico, o suficiente para ler e escrever "vovô viu a uva".
Mas há gente que sabe mais do que isso e maníacos sempre deixaram rastros na história. As possibilidades da informática são infinitas e podem dar a um jovem despreparado o poder de bagunçar a rede de computadores em todo mundo.
Marconi iluminou a estátua do Cristo Redentor, no Rio de Janeiro, a bordo de seu iate. Usou as ondas de sua invenção, o rádio. Invertendo-se o polo de sua façanha tecnológica, um cara qualquer pode apagar não apenas a mesma estátua, mas tudo o que é luz, energia e vida.
Nada entendo de foguetes espaciais, o que não chega a ser vantagem, pois nada entendo de tudo. Fiquei sabendo que entre as causas possíveis de um desastre, uma delas seria a invasão casual ou proposital nos computadores que monitoram os complicados lançamentos.
Lembro a prisão de um rapaz gorducho, óculos fundo de garrafa, tipo que antigamente a gente chamava de "bolão do Vasco". O sujeito, mal saído da adolescência, criara um vírus que infectara milhões de computadores em todo o mundo.
Sempre me preocupei com a ideia de um botão que pudesse acabar não apenas com o mundo, mas com o universo inteiro. Alguma coisa parecida com aquela campainha que o personagem de Eça de Queiroz tocou e matou um mandarim na China, que a quilômetros de distância, vestido em sua túnica amarela, estava empinando um papagaio e caiu fulminado, deixando fabulosa fortuna para o obscuro funcionário de Lisboa.
No tempo de Eça, isso seria impossível. Mas agora, no meu tempo, é uma possibilidade que me fascina e angustia. Ninguém precisa temer que eu faça uma besteira dessas, não por virtude, mas por ignorância. Do mundo digital sei o básico, o suficiente para ler e escrever "vovô viu a uva".
Mas há gente que sabe mais do que isso e maníacos sempre deixaram rastros na história. As possibilidades da informática são infinitas e podem dar a um jovem despreparado o poder de bagunçar a rede de computadores em todo mundo.
Marconi iluminou a estátua do Cristo Redentor, no Rio de Janeiro, a bordo de seu iate. Usou as ondas de sua invenção, o rádio. Invertendo-se o polo de sua façanha tecnológica, um cara qualquer pode apagar não apenas a mesma estátua, mas tudo o que é luz, energia e vida.
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